segunda-feira, 25 de agosto de 2008

As contradições da China








1. Quem passou duas semanas a assistir aos Jogos Olímpicos, viu uma China quase perfeita, com uma grande capacidade de organização, pessoas simpáticas, ruas limpas, recintos desportivos que são marcas arquitectónicas e resultados desportivos muito bons. A segurança apertada, que transformou a zona olímpica numa redoma, nem sequer pode ser apontada como uma crítica, porque estas limitações fazem hoje parte de qualquer grande evento, desportivo ou não. A única crítica talvez seja o facto de muitos elementos ligados à organização, como os voluntários, falarem pouco ou nada de inglês, o que poderia ter sido colmatado recorrendo a mais estrangeiros. Nada, no entanto, que manche uma organização que promete durante muitos anos ser usada como bitola para todas as outras.


2. Esta China olímpica tem uma certa continuidade (ou é uma certa continuidade) do país dos grandes edifícios, do crescimento económico inigualável, dos carros de alta gama nas estradas, da classe média que vive hoje bem, das pessoas que gozam finalmente a vida, passeando-se como turistas na Grande Muralha ou na Praça Tiananmen, com máquinas fotográficas e de filmar.


3.Há, porém, um outro lado, que nem está muito longe. A poucos metros de Tiananmen ou no caminho para o Templo do Céu, a pobreza salta aos olhos, com casas de madeira, interiores de casa com o chão em terra, gente magra por desnutrição. “Ainda há muita probreza”, dizia uma jovem de Hong Kong, que encontrámos na Grande Muralha.


4. Neste balanço entre a China pujante e a China desigual, fico com a sensação de que o povo espera pacientemente que a situação se continue a transformar. “Há dez anos era terrível viver na China”, disse-nos a mesma jovem de Hong Kong. O progresso da última década funciona como esperança de um povo que parece cansado de revoluções e de cortes radicais com o passado. Muitos chineses sabem que a liberdade de imprensa está longe de ser uma realidade e já ouviram ecos da violação de direitos humanos, mas têm um certo medo que mudanças radicais destruam o que melhorou nas suas vidas nas últimas décadas. Talvez o velho provérbio “mais vale um pássaro na mão do que dois a voar” resuma bem o que eles pensam. Esta minha sensação, claro, está longe de ser uma análise sociológica bem fundamentada. É apenas o sentimento com que regresso a Portugal após 23 dias na China olímpica, porque a outra mal a vi.

1 comentário:

MiLady disse...

Gostei muito de acompanhar o vosso blogue ao longo dos dias olímpicos. Uma visão mais pessoal dos jornalistas que vêem de perto o que se vai passando é sempre bem-vinda. Talvez seja de explorar este lado em eventos posteriores.